13 junho, 2013

E a Vida Continua (And the Band Played On, EUA, 1993).

"Força. Amizade. Coragem. As vezes é tudo que possuímos" (Livre tradução do texto disposto no cartaz oficial do filme).
Roger Spottiswoode (007 - O Amanhã Nunca Morre) nunca despontou com uma obra de grande referência no certame do cinema, nunca foi dono de um sucesso avassalador de bilheteria, muito menos galgou sucesso como um diretor de grande influência aos jovens cineastas. É bem verdade sua filmografia é bastante tímida, visto que apresenta alguns bons filmes dentre outros um tanto duvidosos. Portanto, chega a ser surpreendente que um filme da magnitude e importância deste E a Vida Continua tenha caído nas mãos de um cineasta sem tanta expressão (talvez pelo fato desta ter sido uma produção feita originalmente para a tevê, quando a época não existia toda essa busca pela feitura de obras na "telinha" como percebemos hoje). 

Surpresas a parte, o fato é que Spootiswoode surpreende e constrói aqui uma obra estupenda, em muitos sentidos superior a outra que se debruça por  tema semelhante (preconceito e AIDS) e que curiosamente foi lançado no mesmo ano - me refiro a Filadélfia, de Jonathan Demme, produção que rendeu o primeiro Oscar de atuação de Tom Hanks -. E a Vida Continua acerta em cheio ao focar o panorama político à época (anos 1980) como um dos principais vilões do progresso, mas sem abordá-lo de forma exagerada ou recheada de discurso reacionário, muito pelo contrário, atesta a incompetência dos administradores públicos através do viés do despreparo técnico, da insensibilidade e do subterfúgio advindo do preconceito.

A importância do filme é tão grande, tanto pelo resgate que faz de um período crítico não só no contexto social, mas também no contexto referente à saúde pública e a ética, como também pelo caráter atemporal de sua crítica. No final dos anos 1970 e durante toda a década de 1980 a comunicação, apesar de efetiva, não possuía o caráter de instantaneidade existente hoje, até por que o binômio internet/banda larga não passava de ficção-científica. Sendo assim, o quão diferente (no bom e no mau sentido) não seria a repercussão de uma epidemia como a do vírus HIV durante o período abraçado pelo filme se a tecnologia da época fosse a de hoje? Ou, simplesmente se tal mal tivesse nos acertado hoje, em pleno séclo XXI. Certamente a pressão social pró o combate a doença seria muito maior, entretanto, o grau de paranoia, preconceito, conservadorismo e fundamentalismo certamente seria exponencialmente maior, visto que nossa sociedade, avanços técnico-científicos a parte, parece caminhar pela estrada aparentemente sem volta da "descivilidade", bastando apenas um olhar mais atento para que isto seja constadado.

Apesar de ter como foco o trabalho dos pesquisadores do centro de controle de doenças, o caráter humano de destaca em comparação a técnica, inclusive nos próprios pesquisadores, que possuem como espelho de luta e coragem o personagem interpretado por Matthew Modine (Nascido Para Matar), que entrega uma interpretação vigorosa, ao construir o cientista idealista que tenta, mesmo a contragosto daqueles ao seu redor, apresentar a população o quão mortal é a doença então conhecida como "câncer gay". Quem também merece destaque é Alan Alda (O Aviador), que vive um inescrupuloso catedrático e pesquisador que se debruça pela busca da razão e da cura deste mal, com a finalidade não de sanar o problema, mas de conquistar com isso a patente da pesquisa e os louros que a mesma carrega. O ator é absurdamente perfeito na construção deste personagem desprezível, especialmente por fazê-la de forma pontual, sem apelar para gritaria, caras e bocas ou olhares maléficos, por assim dizer.

Recheado de pequenas participações de grandes nomes do cinema - passam pelo filme Richard Gere (A Negociação), Lily Tomlin (Nashville), Ian McKellen (O Hobbit: Uma Jornada Inesperada), Angelica Huston (A Família Adams), Charles Martin Smith (Os Intocáveis), Richard Jenkins (O Homem da Máfia), Tchéky Karyo (Joana D'Arc de Luc Besson), Steve Martin (Os Picaretas), dentre outros -, bem formatado conceitualmente (a adaptação do livro homônimo coube ao veterano Arnold Schulman, de Tucker - Um Homem e seu Sonho), historicamente acurado e muito bem dirigido, E a Vida Continua reafirma a força do cinema como veículo de despertamento ao debate e de manifestação do pensar, contando histórias que servem não apenas hoje como referência, mas também aquelas cujo cerne é atemporal. Sem sombra de dúvidas este é um filme forte, que caso possuísse um valor de produção maior, certamente teria emplacado nos cinemas de todo o mundo e, quiçá, revelado, mesmo que tardiamente, a competência de Spottiswoode como realizador.

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