12 julho, 2013

O Exorcista (The Exorcist, EUA, 1973/2000).

"Alguma coisa, além da sua compressão, está acontecendo com uma garota nesta rua, nesta casa... e um homem foi enviado como último recurso. Este homem é O Exorcista" (Livre tradução da frase disposta no cartaz promocional do filme).
Clássico é clássico, simples assim. Um dos filmes mais respeitados de todos os tempos, cânone do cinema de horror e imitado até hoje, O Exorcista, do polêmico e competente William Friedkin (Killer Joe - Matador de Aluguel), é uma obra inovadora e complexa, que perpassa o universo da possessão demoníaca ao abordar elementos que passeiam pela análise da construção do medo, especialmente relacionado à morte e ao desconhecido, atrelado  à busca pelo perdão, tudo isso dentro de espectro do seio familiar, ambiente este basilar ao filme. Concebido umbilicalmente por Friedkin e William Peter Blatty (autor do romance original e desta adaptação cinematográfica), a obra mantém-se relevante tanto como exemplar de horror - especialmente de cunho psicológico - quanto como cinema, visto que sua qualidade técnico-narrativa permanece irretocavelmente perfeita.

Da escalação do elenco à montagem, do ritmo empregado através desta à manipulação exercida através das técnicas de efeitos sonoros, da audácia em abrir o filme com um prólogo quase que inteiramente mudo, que dura por volta de vinte minutos, aos ainda hoje eficientes efeitos especiais - à época não se dispunha de técnicas de efeitos digitais (CGI) -, da condução primorosa - praticamente matemática - e da excepcional direção de atores de Friedkin ao sintetismo e complexidade (paradoxal, mas verdadeiro) disposto por Blatty, somado ao incrível senso estético da equipe de fotografia, direção de arte e figurino e ao incrível poder de condução das faixas catalogadas à trilha sonora, praticamente tudo em O Exorcista ressoa perfeito aos olhos e ouvidos do espectador, pois busca provocar a dúvida, o temor e a insegurança por meio da crença em que algo está errado e de que não há como fugir disso. O medo é sugerido e, consequentemente desperto, de forma distinta em cada espectador, mas é certo que ele está presente, amparado pela imaginação, pela tentativa de montar imagens e conceitos na mente de cada um de nós e não através de sustos (existem, mas não são foco da narrativa) e superexposições de "bestas" e "monstros".

Tratado, em grande parte, de maneira científica - ou tentando passar esta imagem -, o filme tem pelo menos três linhas narrativas distintas - a saga do padre Lankester Merrin (Max Von Sydow, de Hannah e suas Irmãs) como escavador de relíquias no Iraque, os dilemas passados pelo padre e psiquiatra Damian Karras (Jason Miller) e a rotina familiar de Chris (Ellen Burstyn, de Réquiem para um Sonho) e Regan MacNeil (Linda Blair), que virá a ser afetada pela presença da entidade demoníaca -, mas que nunca deixam de se relacionar ou de despertar menos interesse. O peso dramática de cada uma delas é inquestionável e tanto Friedkin quanto Blatty conseguem extrair ao máximo a tensão e a organicidade do elenco, que é, sem sombra de dúvidas, um dos grandes responsáveis pela qualidade absurda da obra.

Mesmo tendo um elenco afiado praticamente de forma equânime, sinto a necessidade de destacar as performances do quarteto dito principal do filme: Ellen Burstyn, Linda Blair, Max Von Sydow e Jason Miller. A entrega dos quatro é de saltar os olhos, pois o que é visto em tela é uma mãe e uma filha que se amam e que, pouco a pouco, vão sendo afastadas devido a presença do ente maligno - o que, no fim das contas, sagra-se como uma excelente metáfora acerca da força do seio familiar, em especial ao vínculo entre pais e filhos -, um homem cuja fé está abalada, especialmente apos a perda da mãe (mais uma vez o núcleo família aparece com força), mas que buscará a superação/rendição e, por fim, um homem que vem buscando há tempos a resolução de um conflito interno que possivelmente está relacionado ao mal que contamina as personagens de Burstyn e Blair, mas que no momento encontra-se extremamente combalido e desgastado (o background do Padre Merrin é pouco trabalhado de forma explícita, mas os maneirismos empregados por Von Sydow sugerem que este esgotamento passado pelo personagem advém de uma busca longa e árdua por respostas, tanto é que o mesmo fica terrivelmente assustado quando descobre uma peça fundamental durante uma de suas escavações). Este quarteto é, sempre de dúvidas, o coração da obra, pois é através da crença em seus "desarranjos pessoais" que o espectador é convencido a entrar de cabeça neste misto de drama e fantasia de horror, que soa crível e, principalmente, acreditável.

Certamente há muito mais a discorrer acerca desse marco do cinema moderno (que permanece insuperável até hoje), tanto do ponto de vista técnico (Friedkin conduz sua equipe à perfeição, sagrando-se inquestionavelmente como um grande líder) quanto do ponto de vista conceitual (os esforços combinados para a feitura deste filme praticamente inauguraram um novo gênero cinematográfico, além de ter sedimentado a maturidade ao gênero horror), contudo, muito do que é exposto e despertado pelo filme são sustentados como potência quando em caráter subjetivo, pessoal, através da abstração do indivíduo, o que, de certa forma, tornar-se-ia praticamente impossível de ser transposto em texto. O que é, ao meu ver, inquestionável é que O Exorcista é mais do que um simples filme de horror, pois trata do medo através da construção do mesmo, estimula debates e, mesmo tendo um desfecho, deixa perguntas no ar, pois o mal permanece vivo e, vez ou outra, pode adquirir a forma de uma doce e inocente criança de 12 anos de idade. Duvidas?

Obs.: A versão assistida foi a do diretor, lançada nos cinemas em 2000 e disponibilizada em home video logo em seguida. Esta versão contém aproximadamente nove minutos a mais do que a original de 1973.

AVALIAÇÃO
 TRAILER

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