21 julho, 2013

RoboCop - O Policial do Futuro (RoboCop, EUA, 1987).

"Parte homem. Parte máquina. Totalmente tira" (Adaptação da frase contida no poster).
Um dos filmes mais cultuados dos anos 1980, RoboCop - O Policial do Futuro é a primeira incursão do cineasta holandês Paul Verhoeven (O Homem Sem Sombra) em terras norte-americanas e consiste numa ficção-científica recheada de ação e com altas doses de sarcasmo e ironia, além de ser possuidora de um visual apurado e único. Como (quase) todo filme de Verhoeven, a violência é bastante presente à produção. Porém, esta surge tanto como personagem quanto como integrante do cenário apresentado do filme, pois encontra-se amarrada à trama de forma natural, sendo um dos elementos que conduzem a narrativa do filme rumo a consecução dos seus objetivos.

Sem apostar em um elenco de astros, Verhoeven opta aqui por trabalhar com atores e atrizes (à época) não tão conhecidos, mas que conseguem transmitir emoções e "credibilidade" em uma realidade bastante estilizada, sem que as faces dos mesmos chamem mais atenção do que o ambiente distópico apresentado. Do intérprete do policial Alex Murphy e futuro RoboCop, Peter Weller (Mistérios e Paixões), e sua (por pouco tempo) parceira Lewis (Nancy Allen, de Vestida para Matar), passando pelos icônicos vilões Clarence Boddicker (Kurtwood Smith, da série That 70's Show) e Dick Jones (Ronny Cox, de O Vingador do Futuro), praticamente todo o elenco é muito bem posto no filme, encaixando-se à perfeição na Detroit futurista (mas não tanto) apresentada pelo diretor holandês. Temos de um lado a caricatura e os histrionismos dos vilões (Cox e Smith) em contraponto a frieza e uma certa aura de inocência dos heróis (Murphy e Lewis), o que tanto ratifica o viés estilizado da obra, como também ajuda a fixação destas personagens no subconsciente do espectador, pois suas personalidades, seja esta de mocinho ou de bandido, são percebidas de forma imediata, independentemente destes terem seus passados revelados.

(Bom) elenco à parte, o que salta aos olhos neste blockbuster tipicamente oitentista (no mais do que bom sentido) é o seu visual arrojado (a equipe de desenho de produção, figurino, maquiagem e efeitos especias estão de parabéns), o roteiro recheado de referências (da cultura - leia-se mangé/anime - japonesa à alegorias cristã-religiosas) e bem redondinho - a cargo da dupla Edward Neumeier (Tropas Estelares) e Michael Miner (O Passageiro do Futuro 2) -, além dos diálogos poderosos, caricaturais e recheados de frases de efeito, mas que são apresentados numa mistura tão orgânica e crível que funcionam perfeitamente , não tirando o espectador em momento algum da ilusão de realidade - pelo menos momentânea - apresentada pelo filme. A bem verdade entrar no mundo de RoboCop é uma viagem sensacional.

Sem dúvida alguma o estilo visceral e a técnica apurada de Paul Verhoeven é a cereja do bolo em RoboCop e certamente sem o mesmo o filme não seria (nem se consagraria) como o que é. Da abertura em formato de telejornal à primeira exposição do antagonista robótico ED-2009, passando pelo plano sequência que apresenta o personagem Alex Murphy, pela cena que foca os primeiros passos do ciborgue (tomada subjetiva), além da execução daquele - uma das cenas mais viscerais da história do cinema -, é certo que o holandês tem a faca e o queijo na mão e, com grande naturalidade e competência, costura com técnica apurada e muita criatividade a coleção de referências (e sangue, muito sangue) que é RoboCop. Verhoeven literalmente "cospe na cara" do público e da crítica e orquestra uma ópera sanguinolenta acerca de um salvador (in)humano em uma cidade tomada pela violência urbana e pela doença do consumismo desenfreado, que entra em choque com seus "princípios robóticos" ao buscar justiça e encontrar humanidade. Os temas abraçados por RoboCop são inúmeros e merecem maior espaço de discussão - indico a audição do podcast do portal Os Cinéfilos acerca do filme -, mas acredito ter instigado a curiosidade que fomentará o debate.

Ainda no âmbito técnico é impossível não destacar a trilha sonora original composta e executada pelo grande Basil Poledouris (Conan, o Bárbaro), que consegue a façanha de criar temas recheados de sintetizadores e harmonias à lá anos 1980, mas que em momento algum soam datados - bastante similar ao efeito conseguido por filmes como Laranja Mecânica e Blade Runner -  ou irritantes, pelo contrário, reforçam o caráter atemporal do filme, funcionando hoje tão bem quanto à época de seu lançamento. Mais um ponto forte nesta já exemplar produção. É certo que este longa marcou a infância de muitos garotos nascidos e criados na década de 1980 (me incluo entre eles) e muito disto advém do poder de convencimento despertado pelas notas desta trilha sonora, que ao meu ver, ao lado daquela do filme De Volta para o Futuro, é a mais marcante dentre os títulos de ficção-científica lançados daquela década.

Crítica direta a sociedade de consumo norte-americana (que hoje, mais de 25 anos após seu lançamento, continua relevante e se expande a praticamente toda sociedade ocidental e grande parte da oriental), a estupidificação desta e a tecnologia como muleta das imperfeições humanas (o filme não demoniza a tecnologia como essência, mas faz um corte incisivo quanto a má utilização desta pela humanidade, especialmente no âmbito bélico), dentre outros assuntos de grande relevância moral, RoboCop é um raro produto de entretenimento que consegue sagrar-se eficaz tanto como entretenimento para as massas - não à toa o filme foi um grande sucesso de bilheteria e conquistou público de todas as idades, apesar da óbvia violência gráfica (não gratuita) - quanto como parábola de questionamento social, o que por si só o coloca em destaque dentre outras obras que só alcançam um destes importantes atributos ambicionados por todo cineasta minimamente interessado em sucesso, seja em qual nível for.

AVALIAÇÃO

TRAILER

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