13 outubro, 2013

Ferrugem e Osso (De Rouille et D'os, FRA/BEL, 2012).


Jacques Audiard já tinha entregue pelo menos um grande filme com O Profeta, de 2009, mas, sem sombra de dúvidas, o diretor francês se superou com o drama Ferrugem e Osso. Sensível e complexo, mas sem soar maçante ou subjetivo em demasia, Audiard entrega aqui uma obra artística equilibradíssima, que reconhece o existencialismo inerente a percepção de vida de cada indivíduo, aplicando um olhar arguto e, por que não, delicado, acerca de temas tão comuns a todos nós, como amor familiar, relacionamentos amorosos, relação paternal e o ato e desdobramento da perda, seja esta física ou psicológica. Atribuo a esta obra o selo de corajoso, pois é fato que, observando a safra cinematográfica dos últimos anos, é cada vez mais raro encontrar um filme que preze pelo esmero em todos os elementos que compõem o produto cinema: roteiro, luz, som, atuações e "realidade". É preciso "comprar" um filme para que este possa transportá-lo para um outro estado de consciência e isto Ferrugem e Osso consegue.

Afora o primor do roteiro - a cargo de Audiard e Thomas Bidegain, colaborado usual do primeiro -, um dos grandes destaques do filme se encontra na dupla central de atores, que vivem os protagonistas 'ferrugem e osso', Stéphanie e Alain, interpretados respectivamente por Marion Cotillard (Batman, o Cavaleiro das Trevas Ressurge) e Matthias Schoenaerts (A Espiã). O método/abordagem de atuação de ambos é distinto, mas encaixam-se perfeitamente ao enredo desenvolvido por Audiard e Bidegain, inclusive sendo aqueles responsáveis por preencher com vida uma trama que, caso analisada sob um olhar mais criterioso, realmente não traz grandes novidades. Todavia, a inter-relação entre Cotillard e Schoenaerts e seus respectivos personagens é tão forte e crível, que o espectador acaba comprando todos os seus passos, que perpassam momentos de felicidade e tristeza, mas especialmente de reencontro com a própria vida. Apesar de muito acertado, o desempenho de Schoenaerts vez ou outra acaba ofuscado pela composição hipnótica e recheada de camadas da bela e talentosíssima Marion Cotillard, que já papou um Oscar pela cinebiografia Piaf - Um Hino de Amor, de 2007 e, por sua performance em Ferrugem e Osso, acabou recebendo ainda mais indicações (algumas sagrando-a vencedora) nos maiores festivais e premiações ao redor do globo, a exemplo BAFTA, César e Globo de Ouro.

Os demais membros que compõem a equipe comandada por Jacques Audiard também são primorosos, mas destacaria o trabalho de Alexandre Desplat (Moonrise Kingdom) na construção da estupenda a trilha sonora, que nunca se sobressai à proposta narrativa do filme, surgindo e mantendo-se oculta nos momentos exatos. Méritos não apenas para Desplat e Audiard, mas também para a montadora Juliette Welfling (Jogos Vorazes) e para a equipe de som, que adequaram perfeitamente a eliminação do som ambiente (ou diegético) em algumas cenas para que a metáfora visual pudesse se fortalecer, sobressair. Somado ao ótimo trabalho sonoro não poderia deixar de destacar a qualidade estético-visual do filme, cujo maior responsável é o diretor de fotografia Stéphane Fontaine (72 Horas), que utiliza bastante a 'câmara de mão' - o que dá certa 'autenticidade' ao filme - e a utilização pontual de flair, composto utilizando (pelo menos aparentemente) luz natural - certamente J. J. Abrams ficaria com inveja tamanha a poesia proporcionada por Fontaine e Audiard -, o que dá uma beleza (literalmente) resplandecente a obra.

Existencial e otimista, mesmo tendo como corpo muito mais tragédias humanas do que momentos de 'iluminação', Ferrugem e Osso é um filme coerentemente melancólico e abstrato, mas sem deixar de lado a contundência, a 'mensagem redentora', o oportunizar da segunda chance, da renovação, da metamorfose psíquico-existencial. Certamente minha percepção quanto a este filme foi amplificada (ou direcionada, vai saber) devido ao momento bastante delicado pelo qual estou passando, sendo toda essa empatia causada devido a essa conexão mútua entre obra/indivíduo (eu). Abstrações íntimas a parte, é inegável  a qualidade técnica e conceitual do filme Ferrugem e Osso, estando de parabéns Jacques Audiard e sua equipe, que conseguiram canalizar a história do escritor canadense Craig Davidson em um filme bonito, puro e cheio de significados. Espero que, assim como as personagens de Marion Cotillard e Matthias Schoenaerts você consiga compreender a correlação existente entre a dita 'ferrugem e osso'. Particularmente, esta obra me ajudou a reequilibrar parte do meu próprio caminho.

AVALIAÇÃO
TRAILER

Mais Informações:

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Concorda com o texto? Comente abaixo! Discorda? Não perca tempo, exponha sua opinião agora!