11 fevereiro, 2013

O Óleo de Lorenzo (Lorenzo's Oil, EUA, 1992).

"Algumas pessoas fazem seus próprios milagres" (Livre tradução da frase disposta no poster promocional do filme).
Fazer um filme que tenha como tema principal um acontecimento trágico ou um evento real triste é bem complicado, pois é relativamente fácil cair na armadilha da falsa comoção e da exploração de lágrimas vazias. Contudo, O Óleo de Lorenzo, de George Miller (Mad Max), sai pela tangente e não guarda identificação direta com as características citadas, pois mesmo sendo um filme construído para sensibilizar - como não o ser ao abordar uma história tão dolorida? - sua construção não foca apenas no lamento, muito pelo contrário, o filme tem na luta, perseverança, superação e, principalmente, esperança seu direcionamento primordial, o que acarreta numa obra tributo não só a uma família que enfrentou o despreparo da ciência à época e até mesmo o axioma religioso caracterizado por "é a vontade de Deus" e operou seus próprios "milagres", mas também um exemplo de que o homem, quando em situações limites, possui capacidades cognitivas inimagináveis. Romanceamento a parte, Miller realiza aqui, ao lado de Nick Nolte (Cabo do Medo) e Susan Sarandon (A Viagem), uma obra sensível, preciosa e dona de um discurso simples e eficiente, que nos mostra que o escuro só teme a luz (e vice-versa).

A construção do filme é irretocável, pois não perde tempo ao apresentar a condição do menino Lorenzo (Zack O'Malley Greenburg) e enfoca sem meias palavras tanto na deterioração progressiva do garoto, que carrega uma doença genética denominada adrenoleucodistrofica (ALD) - doença esta até então pouquíssimo conhecida pela ciência médica nos anos 1980 -, quanto na angustiante missão comprada por seus pais, Augusto (Nolte) e Michaela Odone (Sarandon), que "enfrentam" a pragmática da ciência, a reticência das organizações de apoio aos pais de filhos portadores de ALD. Apesar de ter tido certo problema com a caracterização de Nolte, especialmente o sotaque carregado empregado pelo mesmo com o intuito de compor um italiano, tanto ele quanto Sarandon se entregam por completo aos seus personagens, não deixando de transparecer um segundo sequer que não são os pais do garoto e que mudariam o curso de rotação do planeta pela vida do filho, se assim pudessem fazer. Inclusive Sarandon abocanhou algumas indicações por este papel, incluindo os sempre visados Globo de Ouro e Oscar. Não levou nenhum deles, mas o reconhecimento é mais do que merecido.

A estrutura narrativa de O Óleo de Lorenzo é bastante objetiva, até por que sua função nada mais é do que condensar (e, por que não, romantizar quando necessário) pouco mais de um ano das vidas da família Odone em cerca de duas horas de filme, recorte este que mostra desde a identificação da condição de saúde do pequeno Lorenzo, até a "descoberta" do óleo com propriedades curativas à ALD, mas isso não significa que o filme torna-se menos impactante ou irretocável devido a possível "previsibilidade" do enredo. Além disso, tem-se como "complemento" a técnica de George Miller, que aposta em enquadramentos sutis, mas que reforçam o poder e o domínio de seu elenco, além da bela fotografia - o que dizer das tomadas nas ilhas Comoro, especialmente a cena das crianças correndo atrás de uma pipa, no início do longa - de John Seale (O Paciente Inglês).

Reverenciado pela crítica e esnobado pelo público à época de seu lançamento, aos poucos O Óleo de Lorenzo galgou sucesso entre a massa, especialmente com o advento do home-video (é possível que sua mãe ou tia tenha este filme como um dos mais emocionantes já vistos) e pode ser considerado como um dos mais bem equilibrados e contundentes filmes já feitos sobre eventos reais. Muito se discutiu acerca do que seria exagero ou não apresentado pelo filme. Considero este tipo de análise uma bobagem, pois o que aconteceu com o Lorenzo real não deve ser encarado como testemunho irretocável para a construção de um filme a seu respeito, já que o cinema, como arte e manifestação cultural, tem suas próprias leis a serem "obedecidas". O Óleo de Lorenzo é uma obra de ficção inspirada por eventos reais, contudo é construída de forma tão contundente e convincente que desconstrói metaforicamente seu aspecto ficcional em verdades ao espectador, que pode não sair totalmente convencido de suas palavras, mas é indiscutível que gera momentos de reflexão. Sendo assim, estão de parabéns George Miller, Nick Enright (co-roteirista), Susan Sarandon, Nick Nolte e demais membros da equipe do longa, além dos verdadeiros Augusto, Michaela e Lorenzo Odone, por sua batalha particular que se transformou em um exemplo da força positiva que o ser humano possui, acabando indiretamente inspirando esta pequena obra de arte e manifesto de luta sem violência que é o filme O Óleo de Lorenzo.

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Comentários
1 Comentários

Um comentário:

  1. Vale ressaltar, Téo, os aspectos sociais trazidos pelo filme em relação ao debate traçado visualmente entre a comprovação científica e o conhecimento comum (mesmo que pautado cientificamente, sem comprovações). O filme nos trouxe uma realidade palpável entre o que a ciência pode considerar como ato verídico e o que a mesma considera apenas especulações, mesmo que apresentem veracidade nos casos da ciência.
    Isso nos leva a perceber como a ciência cria suas verdades e as encara, mesmo estando contraditória e pendente à novas revelações.
    O filme mostra isso muito bem. Excelente.

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