07 dezembro, 2013

Elysium (EUA/AFS, 2013).


De acordo com o Dicionário de Português Online Michaelis, Elísio seria, sob a perspectiva religiosa greco-latina, a "morada dos heróis e homens virtuosos depois da morte", ideia este que encaixa-se ao conceito principal do filme Elysium, escrito e dirigido pelo sul-africano Neill Blomkamp (Distrito 9), que abraça um futuro próximo (cerca de um século adiante do nosso hoje) de ordem distópica, onde o planeta Terra encontra-se com escassez de recursos (de todas as ordens) e parte da população - aquela abastada - passa a residir em um satélite artificial, intitulado Elysium, estrutura esta possuidora de tecnologias avançadíssimas, inclusive maquinários possuidores da capacidade de curar praticamente qualquer enfermidade em qualquer estágio evolutivo. Resumo da ópera: Blomkamp, a exemplo de seu celebrado filme anterior, volta a tratar da temática "apartheidiana" nesta sua primeira obra totalmente abraçada por Hollywood, todavia, adicionando elementos e questionamentos de cunho mais complexo, com um quê premonitório. A intenção é boa, mas infelizmente o cineasta perde a mão em alguns momentos.

Encabeçada por gente do naipe de Matt Damon (Compramos um Zoológico) e Jodie Foster (Contato) e contando com um elenco multinacional - temos no filme nomes como os dos brasileiros Alice Braga (Eu Sou a Lenda) e Wagner Moura (Tropa de Elite) e o sul-africano Sharlto Copley (Esquadrão Classe A), por exemplo -, esta obra visualmente deslumbrante - apesar do desenho de produção ser muito próximo ao de Distrito 9 - possui um alto grau de atração ao espectador, talvez pela opção narrativa de desenvolver um tema de cunho ambicioso sob o ponto de vista de um sujeito comum (Damon), cuja motivação encaixa-se à perfeição ao desenrolar da trama. Todavia, é justamente no aparar destas arestas que se encontra parte da fragilidade do filme: há um desequilíbrio entre a temática ambiciosa do filme e seu desenvolvimento rasteiro, um tanto superficial. Fica a impressão de que o debate político é deixado de lado pelo filme em vários momentos durante a projeção, o que o enfraquece em sua totalidade, tornando-o uma obra menos interessante (conceitualmente falando) do que aparentava.

Apesar do campo político ser pouco desenvolvido pelo filme, o aspecto ação é forte o bastante para despertar o interesse do espectador, mesmo que, numa análise mais acurada, tal ponto possa ser interpretado como uma ferramenta de deslumbramento vazio, o espetáculo pelo espetáculo. Prefiro acreditar que houve boa intenção por parte de Blomkamp e cia. na construção do universo de Elysium, mas talvez o passo dado tenha sido mais largo do que as possibilidades cinematográficas atuais do promissor cineasta, dando vazão a uma obra interessante, mas cujo potencial acabou não sendo plenamente concretizado. Outro ponto que distancia um pouco o filme do pleno acerto se dá na caracterização de alguns personagens do filme, especialmente a de Jodie Foster, que é bastante subaproveitada, sendo até mesmo questionável a escolha de tão gabaritada atriz para conduzir um papel tão insípido e pouco complexo.

É verdade que as personagens que permeiam o filme não passam do limite do arquétipo, o que prejudica um pouco a sensação de organicidade pretendida. Parece que a preocupação com a construção estética foi tão grande (sendo esta destaque absoluto do longa) que o conteúdo ficou em segundo plano, ocasionando assim na pouca amarração dos temas políticos às questões existenciais (as mensagens acerca da formação de caráter do personagem de Damon, infelizmente, soam banais), além do desenvolvimento rasteiro de uma série de personagens e de suas motivações. Felizmente o elenco supera tais adversidades e consegue injetar certo grau de interesse aos personagens (à exceção de Foster), podendo ser destacados o Spider de Wagner Moura - os gritos agudos do ator e os trejeitos no olhar e na forma de andar mostram o grau de compromisso e, por que não, diversão sentida e entregue pelo brasileiro -, o surtado Kruger de Sharlto Copley (do visual a composição, o personagem é fascinante, mesmo que seja construído quase que totalmente na forma de caricatura) e o protagonista underdog Max, vivido com energia por Matt Damon. Nem de longe é um personagem irrepreensível do ator, mas o ator não costuma entregar performances dispensáveis e, portanto, seu Max sagra-se no mínimo convincente.

Apesar de alguns furos no roteiro - a ida e vinda do personagem de William Fichtner (O Cavaleiro Solitário) de Elysium à Terra e vice-versa é confusa -, do insípido comentário político-sócio-existencial defendido pelo filme e da irregularidade quanto a motivação de alguns personagens, Elysium funciona, especialmente como entretenimento de ação (cuja única ressalva residiria no demasiado preciosismo de algumas sequências em câmera lenta, que acabam por enaltecer momentos não cabíveis). É perceptível o cuidado estético desta produção de aproximadamente 115 milhões de dólares (além dos efeitos especiais, destacam-se a direção de arte, figurino e desenho de produção), o que acarreta numa imersão quase que total ao universo apresentado, mesmo que de maneira superficial. Elysium, a exemplo de Oblivion (outra sci-fi lançada em 2013), é uma obra de ficção-científica dotada de um aparato estético primoroso, mas que escorrega fortemente no desenvolvimento de suas ideias, o que é um fenômeno preocupante, pois acaba por falhar no aspecto este primordial para as obras do gênero: o desenvolvimento conceitual.

AVALIAÇÃO
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