16 setembro, 2012

Carne Trêmula (Carne Tremula, ESP, 1997).


Prefiro um Almodóvar mais sério, compenetrado, inventivo dramaticamente e em Carne Trêmula me é dado isso. Nada contra ao cinema bufão e colorido - visualmente e conceitualmente - do cineasta, mas quando o mesmo investe em tramas mais profundas, em alguns casos com um certo toque hitchcokiano, o interesse que a obra desperta em mim pessoa aumenta exponencialmente. Adaptado do romance homônimo de Ruth Rendell, este filme já é iniciado com uma sequência de abertura absurdamente tensa, onde acompanhamos a personagem de Penélope Cruz - em uma pequena ponta - prestes a dar a luz a um garoto que virá a ter importância ímpar à trama como um todo. Com o início baseado no período ditatorial da Espanha e que vai sendo desenvolvido até chegarmos a década de 1990, Carne Trêmula, assim como grande parte da obra do diretor espanhol, tem como base os relacionamentos amorosos, entretanto neste filme em particular a proposta de análise do comportamento humano interligado ao sentimento de amor e rejeição é o fio condutor de toda a trama, que conecta cinco indivíduos num universo de anseios e tragédias, além de muitos desenganos.

Contando com as participações de um bem jovem Javier Bardem (Biutiful), de Francesca Neri (Hannibal), Liberto Rabal, Angela Molina (Baarìa - A Porta do Vento) e José Sancho (Fale com Ela) nos papeis mais importantes da trama, Carne Trêmula é uma experiência de angústia e expectativa, onde acompanhamos a recriação contínua de caráteres numa espécie de confronto moral contínuo, onde o acovardamento e egoísmo de cada uma das personas interpretadas por estes atores é esmiuçada e escancarada por Pedro Almodóvar (Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos). Curiosamente sem contar com nenhuma referência ou alusão ao espectro homossexual - quase que uma característica fixa no cinema do cineasta espanhol -, este talvez seja o filme "menos" Almodovariano de sua filmografia, mas ao mesmo tempo encaixa-se perfeitamente a cinematografia do diretor, visto que encontra-se aqui sua inquietude, seu timing narrativo, enfim, sua visão questionadora e expositiva enquanto cineasta autoral (apesar deste filme ter como base uma história que não sua, é impossível não reconhecer a marca do espanhol no andamento e composição do filme, onde o mesmo praticamente toma posse da obra de Rendell como se esta na verdade fosse apenas sua).

Não há muito o que falar da técnica do filme. Almodóvar filma como ninguém, optando por ângulos e planos finíssimos, em especial a cena do parto disposta no início do filme, em plano aberto e o destaque sutil aos objetos e lugares que terão importância futura à trama. Como já se encontrava mais do que consagrado como realizador, o diretor teve a sua disposição alguns dos melhores profissionais de cinema do mundo, dentre eles o diretor de fotografia brasileiro Affonso Beato (Tudo Sobre Minha Mãe) e o compositor Alberto Iglesias (O Espião Que Sabia Demais), que realmente fazem uma baita diferença no resultado final do filme.

Apesar de possuir uma temática e execução mais próxima do drama que da comédia, Carne Trêmula não é no todo podado de humor, sendo que até mesmo durante sua tensa sequência de abertura temos algumas falas que beiram ao cômico, mas que casam perfeitamente por soarem coloquiais, apesar do tom de graça no meio de um evento tão tenso. Mesmo ainda não tendo conferido grande parte dos filmes de Pedro Almodóvar, tenho como preferido o filme Fale com Ela, drama vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro. Contudo, após conferir Carne Trêmula, posso afirmar seguramente que agora possuo dois filmes igualmente preferidos do cineasta, que por coincidência possuem ambos essência dramática. Indicado ao Oscar de filme estrangeiro e contando com um elenco fenomenal, este pode não ter sido reverenciado e creditado como um dos mais interessantes do espanhol pela crítica especializada, mas alcança para mim o posto mais alto de qualidade do comumente exigente em suas obras Almodóvar.

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