25 novembro, 2012

Memórias (Stardust Memories, EUA, 1980).


Mais uma comédia experimental de Woody Allen (Hannah e suas Irmãs), Memórias em essência trata da crise existencial de um renomado cineasta (Sandy Bates, alter-ego de Allen) e seus dilemas amorosos, nada mais do que os velhos temas de recorrente discussão pelo cineasta, porém impressos aqui de maneira menos convencional, através da estrutura narrativa cheia de avanços e retornos, ou seja, não exatamente linear, a forte exploração de metáforas texto-visuais e a interessante opção estética pela fotografia em branco e preto, a cargo do renomado cinematógrafo Gordon Willis (O Poderoso Chefão). Considerado pelo próprio cineasta como um de seus filmes preferidos, Memórias mostra-se como uma interessante mistura entre cinebiografia e crítica cômica ao culto as celebridades e ao entorno da indústria cinematográfica à época.

Como não poderia deixar de ser, Allen investe bastante no texto do filme, que traz ótimas sacadas e alguns dos seus maneirismos mais marcantes, inclusive a óbvia verborragia, que em seus trabalhos quase sempre se mostram bem-vindas. Temas como fé, filosofia, existencialismo (como não), paranoia, insegurança, simbolismo e política são abordados com maior ou menor atenção pelas linhas escritas pelo cineasta, mas seguramente tem papel fundamental na contextualização da obra, especialmente por esta se tratar de uma reflexão à época do cineasta sobre suas realizações, seu entorno e sua concepção de vida.

As figuras femininas se fazem presente com muita força em Memórias, tendo amplo destaque as interpretadas pelas atrizes Charlotte Rampling (O Veredito), Jessica Harper (Suspiria) e Marie-Christine Barrault (Cousin, Cousine), que influenciam as conjecturas e ações de Bates, inquestionavelmente um homem refém do poder de sedução feminino (mesmo que seja um impreterível traidor). É certo que a estrutura e a pegada reflexiva encontra-se em primeiro plano neste trabalho de Woody Allen, porém o filme em momento algum sagra-se enfadonho ou excessivamente complexo, muito pelo contrário, mesmo apoiado nas reminiscências e ideologias do ator autor, o tom de comédia e entretenimento se sobressai, tornando este um ótimo exemplara para aqueles que admiram ou não a filmografia do cineasta.

Apesar de apontado como um dos trabalhos preferidos pelo próprio autor, não enxergo Memórias como um filme irretocável ou espetacular, até por que muitos dos ecos propostos e das ideias pregoadas pelo mesmo são quase que totalmente desabafos do cineasta à época, possivelmente não refletindo os seus paradigmas de hoje, muito menos o do seu público (seja o daquela época, seja o de hoje). Todavia, mesmo não encontrando-se entre os meus preferidos do autor, Memórias não deixa de ser um grande filme e mais um registro importante da capacidade de Woody Allen em se renovar constantemente mesmo abordando as mesmas temáticas e problematizações.

AVALIAÇÃO

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