"Não é a violência que faz a coragem de um homem. É quão longe ele está disposto a ir..." (Forrest Bondurant, personagem de Tom Hardy a Jack Bondurant, interpretado por Shia Labeauf).
É bem óbvio que este novo trabalho do diretor australiano John Hillcoat (A Proposta) foi idealizado para o público masculino, tamanha a testosterona e - por que não - despropósito apresentado ao narrar a trajetória criminosa dos irmãos Bondurant durante os anos finais da lei Seca nos Estados Unidos e seu violento embate com a força policial local, regado a muita "honra" e sangue. Não que o mesmo não possa ser visto e apreciado por mulheres, porém a temática debruçada pela obra é absolutamente masculina no atingimento do seu cerne.
Com certeza podendo ser categorizado como mais um filme metafórico acerca da sedimentação do norte-americano como povo formado à sangue e suor e que prima pelo alcance do sucesso e da ascensão em vida com o próprio esforço, Os Infratores pode não se debruçar em grandes debates dramático- existenciais, mas resgata de maneira bastante forma crua e direta elementos presentes não só na estrutura "matricial" do homem norte-americano, mas alarga preâmbulo, falando assim do ser macho universal, em seu estado bruto e latente.
Com certeza podendo ser categorizado como mais um filme metafórico acerca da sedimentação do norte-americano como povo formado à sangue e suor e que prima pelo alcance do sucesso e da ascensão em vida com o próprio esforço, Os Infratores pode não se debruçar em grandes debates dramático- existenciais, mas resgata de maneira bastante forma crua e direta elementos presentes não só na estrutura "matricial" do homem norte-americano, mas alarga preâmbulo, falando assim do ser macho universal, em seu estado bruto e latente.
A condução da narrativa feita por Hillcoat e seu parceiro costumaz Nick Cave (O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford) é direta, aplicando uma narração introdutória que resume a figura de cada um dos três irmãos Bondurant, para assim poder desenvolver a trama que acompanha os principais percalços sofridos por eles, especialmente com o afunilamento da persecução da lei devido a chegada de um distinto policial de Chicago. É certo que, apesar de baseado em fatos reais e ambientado no período dourado do contrabando de bebidas nos Estados Unidos, há muito de faroeste neste filme, tanto pela fotografia aplicada por Benoît Dellhomme (1408) quanto pela técnica de Hillcoat, que de certa forma mantém o olhar estético apresentado em seus dois filmes anteriores, A Proposta e A Estrada.
Mesmo que a violência (pesada, mas nunca sem finalidade aos objetivos propostos pela obra) e seus desdobramentos catárticos subliminares (ou não) do espectro homem-macho citado a pouco seja um personagem fortíssimo, não há como negar a força que o elenco de Os Infratores traz ao filme, elevando-o de um bom filme de época para uma quase obra-prima do gênero. Os arquétipos distintos dos irmãos Bondurant distribuídos entre os atores Tom Hardy (Batman, o Cavaleiro das Trevas Ressurge), Shia LaBeauf (Transformers) e Jason Clarke (Inimigos Públicos) literalmente ganham vida, especialmente na composição dos dois primeiros (Clarke tem bem menos tempo em cena do que ambos), tendo Hardy assumido de vez a categoria de criador de tipos (o cara é muito bom) e LaBeauf comprovando que, quando quer, entrega atuações convincentes que não remetam a adolescentes nerds e/ou problemáticos. As (poucas) mulheres do filme são representadas por Jessica Chastain (O Abrigo) e Mia Wasikowska (Jane Eyre), que mesmo não tendo um grande desafio em mãos, despertam interesse por suas personagens.
Entretanto, se há um nome a ser destacado no elenco é Guy Pearce (Prometheus). Interpretando o estranho e deslocado policial Charley Rakes, o inglês surpreende ao abraçar a caricatura para construir um ser duplamente repugnante e curioso, que desperta o interesse imediado do espectador acerca de qual seria a verdadeira natureza do mesmo. Do visual desconexo ao ambiente do filme aos trejeitos e inflexões ao reverberar palavras, Pearce constrói juntamente a Hillcoat e Cave um dos "vilões" mais interessantes dos últimos anos, quiçá o mais estranhamente curioso desde o Anton Chigurh de Javier Bardem, em Onde os Fracos Não Tem Vez. Parece que o ator se mostra sempre a vontade ao trabalhar com o diretor, vide que esta é a terceira parceria entre ambos. Por fim, mas não menos importante, destacaria a presença do jovem Dane DeHaan, que recentemente foi "revelado" ao grande público com o sucesso do filme Poder Sem Limites (e que está muito bem neste Os Infratores), como também a pequena - e narrativamente dispensável - ponta de Gary Oldman (O Espião Que Sabia Demais), cuja participação é sempre interessante.
No todo Os Infratores é um filme muito bem cuidado, que abraça com força um pedaço não muito belo da história norte-americana (que reflete a da própria humanidade) num filme corajosamente violento, mas que carrega no seu íntimo uma poesia visível, não somente acerca do resgate do instinto assassino e da confusão entre honra e vingança tão comum aos seres humanos (tanto machos quanto fêmeas), mas também quanto a mais do que natural tendência dos nossos tempos em trocar os papéis entre ordem e caos, certo e errado, bem e mal, ao traçar os teoricamente vilões do filme (os Bondurant) como mocinhos e os teoricamente heróis do mesmo (Charley Rakes e demais oficiais de polícia) como os bandidos. Os Infratores não é o primeiro filme, muito menos o último a apresentar esta inversão de valores e conceitos, porém o faz de forma objetiva e própria, qualidades estas que asseguram esta incômoda produção como uma das melhores do ano. Pena que as grandes premiações (Oscar incluso) possivelmente irão preteri-la, especialmente devido as não concessões quanto a violência gráfica presentes na obra.
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