CineMografia: A Invenção de Hugo Cabret (Hugo, EUA, 2011).

07 março, 2012

A Invenção de Hugo Cabret (Hugo, EUA, 2011).

"Se você perde o seu propósito é como estar quebrado" (Hugo Cabret).

Antes de mais nada devo dizer que A Invenção de Hugo Cabret foi a melhor experiência em 3D que já tive até então, visto que ela tanto joga a ação ao espectador, quanto insere este dentro do universo imagético da Paris de meados do século XX. Dito isto, finalmente comentarei acerca do grande filme que é A Invenção de Hugo Cabret. Misto de aventura e drama "histórico" (pelo menos no que diz respeito a sua função social), este mais recente trabalho do mestre Martin Scorsese (O Aviador) é emocionante, inspirador, nostálgico e visualmente arrebatador. Como não se encantar com a expressividade e emoção transposta através dos olhos do jovem Asa Butterfield (O Menino do Pijama Listrado), intérprete de Hugo Cabret, com a doçura e espontaneidade de Chloë Grace Moretz (Sombras da Noite) e com a força, domínio e sutileza emanados por Sir Ben Kingsley (Homem de Ferro 3) ao dar vida ao mágico e cineasta pioneiro George Méliès, entregando talvez seu personagem mais marcante desde sua antológica interpretação de Mahatma Gandhi.

Se engana aqueles que rotularam este filme como infantil. Apesar da dupla de protagonistas serem duas crianças, os temas abordados por A Invenção de Hugo Cabret são carregados de complexidade e homenagens, além de possuir um ritmo mais lento em benefício da própria história dentro da história a ser contado. Portanto, há toda uma preparação (ou até mesmo preocupação) do filme para ambientar o espectador antes de revelar do que mesmo este se trata. Além da homenagem ao cinema através do retrato da emblemática figura de George Méliès - homenagem esta que rende as mais belas imagens do filme -, também é importante a apresentação de temas como incompletude do ser humano, solidão e abandono, tudo isto de forma leve (para os padrões de Scorsese) e subjetiva, sendo A Invenção de Hugo Cabret assim um filme de resgate com um prisma altamente emocional. Entretanto, apesar de não ser infantil, isto não quer dizer que o filme não tenha apelo a este público, muito pelo contrário, apesar de sua estrutura mais "séria", o show de imagens e a história tocante são plenamente capazes de entreter e conquistar qualquer criança que realmente aprecie viajar através do cinema.

Contando com excelente elenco de apoio, formado principalmente por nomes como Jude Law (eXistenZ), Ray Winstone (Os Infiltrados), Emily Mortimer (Match Point), Sacha Baron Cohen (Borat) - engraçado como sempre - e Christopher Lee (A Fantástica Fábrica de Chocolate), uma trilha sonora marcante a cargo de Howard Shore (trilogia O Senhor dos Anéis), além de ótimos mas pontuais efeitos-visuais, em A Invenção de Hugo Cabret nos é apresentado um Martin Scorsese diferenciado, mais saudosista e leve (de certa forma lembrando muito o que Roman Polanski fez em seu Oliver Twist), nesse que é o seu primeiro filme com classificação livre para todas as idades, contudo tão competente e preciso como em seus melhores trabalhos, categoria em que com toda certeza se encontra este seu belo filme.

ATUALIZAÇÃO (28/1/2014).

O roteiro de John Logan (Gladiador) organiza muito bem as ideias do livro de Brian Selznick, que prestigia tanto os diálogos (simples, mas memoráveis) quanto a ambientação, que ganha vida através dos projetos conduzidos pelo mestre Dante Ferretti (O Nome da Rosa) e magistralmente captada pelas lentes de Robert Richardson (Platoon). Junte um visual de encher os olhos, um texto reverente e que desperta interesse, um ritmo equilibrado (palmas a montadora Thelma Schoonmaker) e uma trilha sonora cativante (Shore) e entregue a um dos maiores cineastas vivo de todos os tempos e temos nada menos que um espetáculo visual de primeira grandeza. Através de A Invenção de Hugo Cabret Martin Scorsese presta homenagem não apenas a um dos sedimentadores da arte cinematográfica e a própria essência do cinema, mas também ao cerne da infância, a busca pela aventura de se viver, a bonança da ilusão saudável, aquele que nos transporta por mundos, nos encanta em sonhos, nos faz viver infinitamente enquanto o projetor nos envolve de imagens. Narizes torcidos a parte, Scorsese e cia. transformam o doce e comovente A Invenção de Hugo Cabret numa aula de cinema e, por que não, de cidadania artística.

AVALIAÇÃO